Tal como prometido, e se bem que tenha a distinta impressão que as minhas "crónicas peruanas" não despertam qualquer tipo de interesse, termino hoje a série de três posts dedicados ao
Peru com considerações sobre a religiosidade daquele país e aspectos derivados.
Afirmo muitas vezes, em jeito de profecia, que daqui a uma geração a Igreja Católica, pelo menos na Europa, estará morta. No entanto, quando isso acontecer, tenho a certeza de que ela continuará viva na América Latina. Pude verificar no Peru a acuidade das "amostras" caracterizadoras da vivência religiosa naquela região que nos vão chegando, sob a forma de filmes, livros, quadros...
Não gosto de me render a estereotipos, mas a verdade é que neste caso ele parece corresponder à verdade: a experiência religiosa latino-americana é algo completamente à parte. A anos-luz do bafio que em Portugal bem conhecemos e que vai paulatinamente fazendo as pessoas simplesmente parar de acreditar, no Peru tudo o que é religião é, tal como na política ou na sociedade em geral, cheio de cores, de originalidade, por vezes até demais.
A verdade é que os peruanos vivem a religião - todos eles, quer de ascendência visivelmente espanhola quer indígena (100% da população, aliás, é mestiça; a diferença é unicamente a cor da pele e os genes que determinam aquilo que convencionamos chamar de "raça": 40% espanhóis, 60% indígena) - todos eles, repito, se dedicam de uma forma especialmente devota, quantas vezes a raiar a beatice.
Por esse motivo, a religião se sente-se de forma muito, muito forte, premente, por todo o lado inexorável, tanto nas metrópoles como no recanto montanhoso mais remoto. Naturalmente a Igreja Católica é fortíssima e extremamente influente até no campo político. No entanto, o Vaticano também é muito longe, e por isso as "originalidades" latino-americanas, fruto de fortíssimas influências
incas (no Peru como na Bolívia e em partes do Equador, Chile e Argentina, pelo menos) ou de outras culturas pré-colombianas, são perfeitamente toleradas e estão há muito tempo tão enraizadas que constituem um verdadeiro dogma.
(a "dança dos diabos", que parecem ter feições estranhamente familiares... bigode, cornos e chicote, os espanhóis como encarnação diabólica? é a minha interpretação desta dança algo ridícula que vi no centro de Lima, por ocasião das festas da cidade, em honra de Nossa Senhora de qualquer coisa - os limenhos que me perdoem, mas não me recordo - que duram todo o mês de Outubro, e que para além de danças como esta incluem monumentais procissões em que se leva um andor que transporta a dita Nossa Senhora, andor esse com mais de uma tonelada de ouro!!...)
(primoroso: cartaz à porta de uma igreja, pedindo que se desligue o telemóvel, para permitir "falar com Deus" sem distracções dos meros mortais que usam tal aparelho...)
("Purgatorio - via pedonal": não, não é o caminho a pé para o sítio propriamente dito, é apenas um original nome de rua em Cusco)E mais não acrescento, deixo adicionais considerações para os comentários, isto se alguém quiser comentar..