(este post tem o alto patrocínio de Sua Diabolidade Bento XVI)O Papa Bento XVI acabou de publicar uma exortação apostólica (traduzindo para português laico, é uma espécie de documento com linhas de orientação),
Sacramentum Caritatis (tradução para português não recomendada, como se verá adiante), onde faz diversas recomendações que, estou certo, finalmente porão a Igreja no caminho certo.
Assim, sugere-se
"não admitir aos sacramentos os divorciados recasados, porque o seu estado e condição de vida contradizem objectivamente aquela união de amor entre Cristo e a Igreja".
Partindo do princípio de que todos os padres serão terão a divina iluminação de distinguir, de entre todos os seus fiéis, aqueles que estão nesta condição, isto não pode deixar de ser visto como um grande passo em frente: afinal, as igrejas são locais de meditação e oração, onde o silêncio deve imperar, e missas com mais de vinte fiéis perturbam esse ideal silêncio. Por isso, quanto menos pessoas, melhor será a celebração.
Aliás, suspeito que em próximas recomendações o Papa também excluirá da eucaristia todos os que não tiverem efectuado a primeira comunhão e o crisma, etc. Na sequência de tal salutar diminuição de frequentadores das missas, outros grupos se perfilam para serem liminarmente excluidos:
- quem tenha abortado (como em Portugal já sabemos desde a campanha para o referendo);
- quem nunca tenha feito peregrinação a Fátima ou a Santiago (a pé, claro);
- quem não cumpra rigorosamente os 40 dias de jejum da Quaresma;
- quem tenha relações sexuais com fins (cruz credo) de mero prazer libidinoso e egoísta, sem tentar a reprodução;
- quem utilize métodos contraceptivos, esses artefactos do demo;
- quem não tome a iniciativa de chamar Bento a pelo menos um dos seus filhos;
- claro que dos homossexuais(eze) nem se fala...
Quando todas estas directivas estiverem em vigor, a missa poderá então ser uma ocasião de celebração perfeita, em que o sacerdote terá todas as condições para que as belas palavras eucarísticas ecoem no silêncio, para que possa contemplar a sua bela igreja vazia e comungar sozinho.
Mas Sua Diabolidade vai mais longe, e num rasgo de ousadia, aconselha aos sacerdotes um maior uso do latim e do canto gregoriano. Se do canto gregoriano não é preciso frisar a enorme popularidade (basta ver os milhares de discos vendidos de qualquer álbum edição de cantos gregorianos), já a maior utilização do latim é o necessário passo
avant garde para colocar a missa em linha com a arte pós-moderna.
Eu aqui no Altermundo associo-me desde já a este moderno desígnio, pelo que o resto do post será escrito em latim:
Tandem vaticanus habeo audentia et expedio intro semita rectus, semita Ecclesia sine fidelia (tantum impedimentum, ut videor), et vivere per siglo rectus, siglo qui vivemus, nimirum, siglo XVI.Perceberam alguma coisa? Não?!?
Pois bem, também não perceberão as missas, como ninguém perceberá. Mas como os católicos adoram ficar uma hora num sítio a ouvir alguém falar uma língua morta de que não entendem nada, continuarão entusiasticamente a ir à missa, e até a obrigar os seus filhos que querem tirar direito - afinal, que melhor forma de aprender o b-a-ba do ramo?
O futuro da Igreja, o milagre da multiplicação dos fiéis, está pois assegurado.
(
para os leigos que não percebem latim - como eu, que só consegui escrever umas míseras palavras à custa de muito suor e do Internet Dictionary Project, o único que encontrei com tradução online para latim - e que portanto não poderão frequentar a igreja, a tradução do que escrevi acima:
Finalmente o Vaticano tem a coragem e a lucidez de caminhar no rumo certo, o de uma Igreja sem fiéis (só atrapalham, como vimos), e de viver no século certo, aquele em que vivemos, obviamente, o séc. XVI.)